A relação entre cristianismo e filosofia, é saber se podemos falar em uma "filosofia cristã".
Citação de Walter Daniel Mena em junho 29, 2023, 1:18 amÉ importante considerar a situação política quando o cristianismo começou a tomar forma. Como já vimos, Alexandre operou uma profunda transformação na cultura grega: "Alexandria tornou-se um enclave verdadeiramente cosmopolita e eclético. Um verdadeiro caldo, onde interagiam diferentes religiões e diferentes correntes filosóficas: judeus, pagãos e cristãos, por um lado; aristotélicos, platônicos, cépticos, estoicos, epicuristas, por outro. Estes transformaram a cidade num cenário propício para o surgimento de uma nova visão filosófica: uma concessão em que o pensamento racional e a revelação teológica se conjugavam". (Barrera 2021). Este ambiente intelectual terá sido uma das razões pelas quais o cristianismo, nascido no seio da religião judaica, se distinguiu desta última, assumindo desde logo a sua vocação universal. Assim, esta nova crença não liga a religião a uma determinada cultura, raça ou estado.
Bertrand Russell também se refere a esta relação entre o judaísmo, o cristianismo e a filosofia grega, enumerando os principais elementos judaicos e helênicos que se manifestam no cristianismo. Para começar, a religião de Jesus faz sua a história sagrada que começa com a "Criação" e culmina no fim dos tempos. A partir dela, explica-se a relação de Deus com os homens. Em segundo lugar, as duas religiões reconhecem a existência de um grupo de homens preferidos por Deus, para os judeus o seu povo, para os cristãos "os eleitos": "muitos são chamados e poucos são escolhidos" (Matheus 22-14). (Matheus 22-14). Há também uma convergência no novo conceito de justiça: a "caridade". Esta, enquanto virtude, já se encontra no judaísmo tardio e adquire uma importância capital para os cristãos: A filantropia prática, a qual é o elemento fundamental do conceito cristão desta virtude, parece ter vindo dos judeus. Do mesmo modo, o conceito cristão dos mandamentos também fazia parte da Lei hebraica. O cristianismo adotou o Decálogo, mas rejeitou as suas partes cerimoniais e rituais. Na prática, porém, ligaram ao credo muitos dos mesmos sentimentos que os judeus ligavam à Lei. Daí decorre a doutrina de que a crença correta é pelo menos tão importante como a ação virtuosa, uma doutrina essencialmente helênica. O que é de origem judaica é a exclusividade da eleição. O elemento comum seguinte é a espera do "Messias". Os judeus acreditavam que o Messias lhes traria a prosperidade temporal e a vitória sobre os seus inimigos aqui na terra; para os cristãos, no entanto, o "Messias" era o Jesus histórico, também identificado com o "Logos" da filosofia grega, mas a sua missão não era a dos assuntos temporais; em vez disso, ele permitirá que os seus seguidores triunfem sobre os seus inimigos no além. Se o meu reino não fosse deste mundo, os meus servos lutariam para que eu não fosse entregue aos judeus" (João 18:36). (João 18:36). O conceito de outro mundo, no entanto, é uma concepção que os cristãos, em certo sentido, partilharam com o platonismo posterior. Mas tomou, com eles, uma forma muito mais concreta do que com os filósofos gregos. A ideia grega encontrada na filosofia cristã era a de que o mundo sensível é uma ilusão e que, através da disciplina intelectual e moral, o homem pode aprender a viver no mundo eterno, que é o único real. Por seu lado: a doutrina cristã, pelo contrário, concebia o Outro Mundo como diferente deste mundo, não numa perspectiva metafísica, mas no futuro, quando os virtuosos gozarão da glória eterna e os ímpios sofrerão tormentos eternos: "Porque o reino de Deus não é comida nem bebida, mas justiça, e paz, e alegria no Espírito Santo (romanos 14,17)."
O helenista W. Jaeger argumentou que os ideais culturais gregos e a fé cristã se misturaram neste processo, dando origem à nossa cultura atual. A cristianização dos grandes filósofos pagãos, com a incorporação de concepções sobretudo platônicas e estoicas. A adoção de ritos, como o batismo, cerimônia inicial no cristianismo, pode ter sido derivada do próprio orfismo. Em todo caso, é evidente que o cristianismo marca uma profunda divisão na história da filosofia. Falamos de antes e depois de Cristo para distinguir duas fases muito diferentes do pensamento ocidental.
O grande problema que atravessa a relação entre cristianismo e filosofia é saber se se pode falar de uma "filosofia cristã".
É muito claro que o cristianismo é uma religião, não uma filosofia. "Só podemos chamar filosofia cristã à filosofia dos cristãos enquanto tal, isto é, àquela que é determinada pela situação cristã de que parte o filósofo" (Julián 1958).
Mais radical ainda é a posição de Bréhier, que afirmava que a mensagem do cristianismo não é doutrinal, mas moral e que, por isso, o cristianismo não contribuiu em nada para a filosofia; segundo ele, em nenhum período da história há filosofias que mereçam ser chamadas cristãs. Em resposta a esta afirmação, muitos pensadores cristãos, filósofos e teólogos, revisitaram para refutar a tese de Bréhier. Para eles, a mensagem do Evangelho inclui evidentemente doutrinas importantes: a existência de um Deus pessoal e único, que pode ser conhecido a partir das criaturas, a livre criação do universo, a providência, a espiritualidade e a imortalidade da alma humana, a liberdade e a responsabilidade do homem perante Deus, a remuneração do bem ou do mal na vida futura após a morte.
Considero que há que distinguir dois problemas diferentes: por um lado, se o cristianismo é ou não uma filosofia e, por outro, se o fenômeno do surgimento do cristianismo na Antiguidade trouxe como consequência a introdução de novos temas que enriqueceram ou, conforme o caso, desafiaram significativamente a filosofia. Um exemplo crucial é o conceito de criação. A tradição judaico-cristã opõe-se ao pressuposto grego: "do nada, nada sai"; pois Deus cria o mundo a partir do nada. Para os gregos, o problema era o movimento, mas o movimento tem sempre um substrato, uma substância. O que se opõe ao "ser" é o "não-ser". Mas, a partir do cristianismo, o que ameaça o "ser" é o "nada". Para o grego, o mundo é algo que varia, mas ele não conhecia "o risco de ser nada". Do mesmo modo, para o cristão, o significado de "ser" terá duas manifestações diferentes: "o ser de Deus" e "o ser do mundo" e, como já dissemos, "o ser do mundo" explica-se via: "a criação". "Deste modo, o cristianismo, que não é filosofia, afeta de modo decisivo, e esta filosofia, que nasce da situação radical do homem cristão, é a que se pode chamar, neste sentido concreto, filosofia cristã". Segundo Gilson, as principais noções cristãs de filosofia são: "o conceito de ser, em geral, que remete para uma relação (de criação) entre Deus e a criatura, e de ser Deus supremo, em particular, que identifica com Deus a noção de causa derivada do ato de criação; a mesma ideia de criação conduz à da pessoa humana, como sujeito individual responsável e à antropologia que daí decorre; a "verdade" em relação à verdade divina e à orientação realista da teoria tomista do conhecimento" (Gilson, Étienne 1970).De fato, embora nas culturas antigas seja possível encontrar manifestações que reconhecem os direitos da pessoa, é o pensamento cristão que exprime a dignidade radical do ser humano, considerado e criado à imagem e semelhança de Deus. Desta concepção decorre a igualdade de todos os homens, derivada da unidade de filiação de um mesmo pai.
É importante considerar a situação política quando o cristianismo começou a tomar forma. Como já vimos, Alexandre operou uma profunda transformação na cultura grega: "Alexandria tornou-se um enclave verdadeiramente cosmopolita e eclético. Um verdadeiro caldo, onde interagiam diferentes religiões e diferentes correntes filosóficas: judeus, pagãos e cristãos, por um lado; aristotélicos, platônicos, cépticos, estoicos, epicuristas, por outro. Estes transformaram a cidade num cenário propício para o surgimento de uma nova visão filosófica: uma concessão em que o pensamento racional e a revelação teológica se conjugavam". (Barrera 2021). Este ambiente intelectual terá sido uma das razões pelas quais o cristianismo, nascido no seio da religião judaica, se distinguiu desta última, assumindo desde logo a sua vocação universal. Assim, esta nova crença não liga a religião a uma determinada cultura, raça ou estado.
Bertrand Russell também se refere a esta relação entre o judaísmo, o cristianismo e a filosofia grega, enumerando os principais elementos judaicos e helênicos que se manifestam no cristianismo. Para começar, a religião de Jesus faz sua a história sagrada que começa com a "Criação" e culmina no fim dos tempos. A partir dela, explica-se a relação de Deus com os homens. Em segundo lugar, as duas religiões reconhecem a existência de um grupo de homens preferidos por Deus, para os judeus o seu povo, para os cristãos "os eleitos": "muitos são chamados e poucos são escolhidos" (Matheus 22-14). (Matheus 22-14). Há também uma convergência no novo conceito de justiça: a "caridade". Esta, enquanto virtude, já se encontra no judaísmo tardio e adquire uma importância capital para os cristãos: A filantropia prática, a qual é o elemento fundamental do conceito cristão desta virtude, parece ter vindo dos judeus. Do mesmo modo, o conceito cristão dos mandamentos também fazia parte da Lei hebraica. O cristianismo adotou o Decálogo, mas rejeitou as suas partes cerimoniais e rituais. Na prática, porém, ligaram ao credo muitos dos mesmos sentimentos que os judeus ligavam à Lei. Daí decorre a doutrina de que a crença correta é pelo menos tão importante como a ação virtuosa, uma doutrina essencialmente helênica. O que é de origem judaica é a exclusividade da eleição. O elemento comum seguinte é a espera do "Messias". Os judeus acreditavam que o Messias lhes traria a prosperidade temporal e a vitória sobre os seus inimigos aqui na terra; para os cristãos, no entanto, o "Messias" era o Jesus histórico, também identificado com o "Logos" da filosofia grega, mas a sua missão não era a dos assuntos temporais; em vez disso, ele permitirá que os seus seguidores triunfem sobre os seus inimigos no além. Se o meu reino não fosse deste mundo, os meus servos lutariam para que eu não fosse entregue aos judeus" (João 18:36). (João 18:36). O conceito de outro mundo, no entanto, é uma concepção que os cristãos, em certo sentido, partilharam com o platonismo posterior. Mas tomou, com eles, uma forma muito mais concreta do que com os filósofos gregos. A ideia grega encontrada na filosofia cristã era a de que o mundo sensível é uma ilusão e que, através da disciplina intelectual e moral, o homem pode aprender a viver no mundo eterno, que é o único real. Por seu lado: a doutrina cristã, pelo contrário, concebia o Outro Mundo como diferente deste mundo, não numa perspectiva metafísica, mas no futuro, quando os virtuosos gozarão da glória eterna e os ímpios sofrerão tormentos eternos: "Porque o reino de Deus não é comida nem bebida, mas justiça, e paz, e alegria no Espírito Santo (romanos 14,17)."
O helenista W. Jaeger argumentou que os ideais culturais gregos e a fé cristã se misturaram neste processo, dando origem à nossa cultura atual. A cristianização dos grandes filósofos pagãos, com a incorporação de concepções sobretudo platônicas e estoicas. A adoção de ritos, como o batismo, cerimônia inicial no cristianismo, pode ter sido derivada do próprio orfismo. Em todo caso, é evidente que o cristianismo marca uma profunda divisão na história da filosofia. Falamos de antes e depois de Cristo para distinguir duas fases muito diferentes do pensamento ocidental.
O grande problema que atravessa a relação entre cristianismo e filosofia é saber se se pode falar de uma "filosofia cristã".
É muito claro que o cristianismo é uma religião, não uma filosofia. "Só podemos chamar filosofia cristã à filosofia dos cristãos enquanto tal, isto é, àquela que é determinada pela situação cristã de que parte o filósofo" (Julián 1958).
Mais radical ainda é a posição de Bréhier, que afirmava que a mensagem do cristianismo não é doutrinal, mas moral e que, por isso, o cristianismo não contribuiu em nada para a filosofia; segundo ele, em nenhum período da história há filosofias que mereçam ser chamadas cristãs. Em resposta a esta afirmação, muitos pensadores cristãos, filósofos e teólogos, revisitaram para refutar a tese de Bréhier. Para eles, a mensagem do Evangelho inclui evidentemente doutrinas importantes: a existência de um Deus pessoal e único, que pode ser conhecido a partir das criaturas, a livre criação do universo, a providência, a espiritualidade e a imortalidade da alma humana, a liberdade e a responsabilidade do homem perante Deus, a remuneração do bem ou do mal na vida futura após a morte.
Considero que há que distinguir dois problemas diferentes: por um lado, se o cristianismo é ou não uma filosofia e, por outro, se o fenômeno do surgimento do cristianismo na Antiguidade trouxe como consequência a introdução de novos temas que enriqueceram ou, conforme o caso, desafiaram significativamente a filosofia. Um exemplo crucial é o conceito de criação. A tradição judaico-cristã opõe-se ao pressuposto grego: "do nada, nada sai"; pois Deus cria o mundo a partir do nada. Para os gregos, o problema era o movimento, mas o movimento tem sempre um substrato, uma substância. O que se opõe ao "ser" é o "não-ser". Mas, a partir do cristianismo, o que ameaça o "ser" é o "nada". Para o grego, o mundo é algo que varia, mas ele não conhecia "o risco de ser nada". Do mesmo modo, para o cristão, o significado de "ser" terá duas manifestações diferentes: "o ser de Deus" e "o ser do mundo" e, como já dissemos, "o ser do mundo" explica-se via: "a criação". "Deste modo, o cristianismo, que não é filosofia, afeta de modo decisivo, e esta filosofia, que nasce da situação radical do homem cristão, é a que se pode chamar, neste sentido concreto, filosofia cristã". Segundo Gilson, as principais noções cristãs de filosofia são: "o conceito de ser, em geral, que remete para uma relação (de criação) entre Deus e a criatura, e de ser Deus supremo, em particular, que identifica com Deus a noção de causa derivada do ato de criação; a mesma ideia de criação conduz à da pessoa humana, como sujeito individual responsável e à antropologia que daí decorre; a "verdade" em relação à verdade divina e à orientação realista da teoria tomista do conhecimento" (Gilson, Étienne 1970).
De fato, embora nas culturas antigas seja possível encontrar manifestações que reconhecem os direitos da pessoa, é o pensamento cristão que exprime a dignidade radical do ser humano, considerado e criado à imagem e semelhança de Deus. Desta concepção decorre a igualdade de todos os homens, derivada da unidade de filiação de um mesmo pai.
Citação de Cosmino Evangelista de Souza Neto em julho 19, 2023, 7:45 pmExatamente, uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa, somos Filhos de Deus, isso já nos basta.
Exatamente, uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa, somos Filhos de Deus, isso já nos basta.