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Apenas narrativas, em diferentes linguagens

No século XIX fazia sentido pensar em uma diferença entre literatura, filosofia e psicanálise, pois ainda não havia se instalado a crise da modernidade, a crise da ciência, ainda se acreditava em certezas e verdades absolutas. Uma maneira de diferenciar literatura, filosofia e psicanálise é fixar-lhes diferentes objetos. A literatura cuidaria da expressão artística, a filosofia da investigação racional do universo e a psicanálise da investigação da psique humana.

Hoje já não tem sentido compreender esses campos do saber dessa maneira estanque. Com as descobertas na física quântica não se pode sequer ter certeza acerca do próprio conhecimento, vivemos uma era de incertezas, em que a realidade não é algo preexistente e independente de nós, ela seria construída, através de narrativas.

A teoria narrativa, cujos representantes mais ilustres são Paul Ricoeur, Alasdair MacIntyre, Charles Taylor e Oliver Sacks, argumenta que a narrativa é uma estratégia humana básica para lidar com elementos fundamentais da experiência, como tempo, processo e mudança. A ideia central do narrativismo é que não existe uma verdade objetiva fora das narrativas. As narrativas são as ferramentas pelas quais damos sentido ao mundo e a nós mesmos. Assim, literatura, filosofia, psicanálise seriam apenas narrativas, porque a experiência humana é fundamentalmente narrativa. Tudo o que percebemos e entendemos é filtrado por histórias e narrativas, sejam elas pessoais, culturais ou sociais.

Pode-se vislumbrar uma diferença de linguagem entre literatura, filosofia e psicanálise, mas essas diferenças, que se mostram como nuances de um prisma, não mudam o fato de que a realidade é fundamentalmente narrativa, e que não existe uma verdade objetiva fora das narrativas que criamos e compartilhamos. 

Embora o narrativismo seja a posição mais explícita, outras correntes filosóficas, como o pós-estruturalismo e o construtivismo, também enfatizam o papel da linguagem e da narrativa na construção da realidade, embora com nuances diferentes. Portanto, hoje a diferença entre literatura, filosofia e psicanálise está mais tênue porque conforme ensina Ricoeur, o tempo só se torna humano quando posto em narrativa, então é necessário que seja possível, para todo mundo, reconquistar sua própria história de uma vida vivida como história.  

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Lucio de Almeida