Imagem e Subjetividade
Citação de ADÉRICA YNIS FERREIRA CAMPOS em junho 25, 2025, 10:16 pmA constituição do eu na psicanálise é uma questão central e complexa, que envolve a articulação entre o sujeito, o corpo, a linguagem e o outro. Para Freud, o eu (ou ego) não é dado desde o nascimento, mas constitui-se progressivamente a partir de uma relação conflituosa com o mundo externo e com as instâncias internas do psiquismo. Inicialmente, o bebê é dominado pelo princípio do prazer e não distingue claramente o que é ele próprio e o que é externo. O eu começa a se formar a partir da diferenciação entre o interno e o externo, o prazer e o desprazer, num processo de identificação com objetos e com o próprio corpo. Freud elabora essa ideia principalmente em textos como O Ego e o Id, onde descreve o eu como uma instância mediadora, ao mesmo tempo serva e senhor dos impulsos inconscientes, das exigências da realidade e da moral.
Com Lacan, a concepção do eu ganha uma nova dimensão: ele o distingue do sujeito do inconsciente e propõe que o eu é uma formação imaginária, constituída no registro do "estádio do espelho". Nesse momento crucial, o infante se reconhece na imagem de um corpo total no espelho, criando uma ilusão de unidade e domínio sobre si mesmo, embora esse reconhecimento se dê a partir de uma imagem externa. Essa imagem especular funda o eu como uma construção alienada, pois ele se identifica com uma forma idealizada, dada pelo outro. O eu, portanto, é uma ficção necessária, estruturada no campo do Imaginário, mas enredada nas redes do Simbólico, ou seja, da linguagem. O sujeito, ao entrar na linguagem e ser nomeado, é dividido, faltoso, marcado pelo desejo do Outro. Assim, o eu nunca é idêntico ao sujeito do inconsciente, que é evanescente, articulado nos lapsos, nos atos falhos, nos sintomas.
Françoise Dolto, por sua vez, contribui para essa discussão a partir da clínica infantil e introduz a noção de "imagem inconsciente do corpo", segundo a qual o eu se constitui com base numa representação simbólica do corpo que não é simplesmente anatômica ou biológica, mas resultado de um processo relacional e significante. Para Dolto, o corpo é linguagem desde o início, e a criança constrói a imagem de si mesma a partir das interpretações e mensagens do Outro — pais, cuidadores, linguagem — que vão sendo incorporadas e moldam o seu modo de estar no mundo. Ela considera que o eu surge como resultado de uma história de escuta e significação do desejo da criança, que se expressa mesmo antes do domínio da linguagem verbal. Nesse sentido, o eu não é apenas um produto da maturação biológica, mas é essencialmente uma construção simbólica que implica o reconhecimento da alteridade e a inscrição do sujeito na cadeia de significantes.
Em síntese, Freud vê o eu como uma instância psíquica em conflito com o id, o supereu e a realidade; Lacan desvela o eu como uma imagem alienada, estruturada no campo do Imaginário, distinta do sujeito dividido do inconsciente; Dolto, por sua vez, mostra que o eu se enraíza numa imagem do corpo construída na relação simbólica com o outro. Em todos os três, a constituição do eu é um processo mediado, não espontâneo, profundamente marcado pela linguagem, pelo desejo e pela alteridade.
A constituição do eu na psicanálise é uma questão central e complexa, que envolve a articulação entre o sujeito, o corpo, a linguagem e o outro. Para Freud, o eu (ou ego) não é dado desde o nascimento, mas constitui-se progressivamente a partir de uma relação conflituosa com o mundo externo e com as instâncias internas do psiquismo. Inicialmente, o bebê é dominado pelo princípio do prazer e não distingue claramente o que é ele próprio e o que é externo. O eu começa a se formar a partir da diferenciação entre o interno e o externo, o prazer e o desprazer, num processo de identificação com objetos e com o próprio corpo. Freud elabora essa ideia principalmente em textos como O Ego e o Id, onde descreve o eu como uma instância mediadora, ao mesmo tempo serva e senhor dos impulsos inconscientes, das exigências da realidade e da moral.
Com Lacan, a concepção do eu ganha uma nova dimensão: ele o distingue do sujeito do inconsciente e propõe que o eu é uma formação imaginária, constituída no registro do "estádio do espelho". Nesse momento crucial, o infante se reconhece na imagem de um corpo total no espelho, criando uma ilusão de unidade e domínio sobre si mesmo, embora esse reconhecimento se dê a partir de uma imagem externa. Essa imagem especular funda o eu como uma construção alienada, pois ele se identifica com uma forma idealizada, dada pelo outro. O eu, portanto, é uma ficção necessária, estruturada no campo do Imaginário, mas enredada nas redes do Simbólico, ou seja, da linguagem. O sujeito, ao entrar na linguagem e ser nomeado, é dividido, faltoso, marcado pelo desejo do Outro. Assim, o eu nunca é idêntico ao sujeito do inconsciente, que é evanescente, articulado nos lapsos, nos atos falhos, nos sintomas.
Françoise Dolto, por sua vez, contribui para essa discussão a partir da clínica infantil e introduz a noção de "imagem inconsciente do corpo", segundo a qual o eu se constitui com base numa representação simbólica do corpo que não é simplesmente anatômica ou biológica, mas resultado de um processo relacional e significante. Para Dolto, o corpo é linguagem desde o início, e a criança constrói a imagem de si mesma a partir das interpretações e mensagens do Outro — pais, cuidadores, linguagem — que vão sendo incorporadas e moldam o seu modo de estar no mundo. Ela considera que o eu surge como resultado de uma história de escuta e significação do desejo da criança, que se expressa mesmo antes do domínio da linguagem verbal. Nesse sentido, o eu não é apenas um produto da maturação biológica, mas é essencialmente uma construção simbólica que implica o reconhecimento da alteridade e a inscrição do sujeito na cadeia de significantes.
Em síntese, Freud vê o eu como uma instância psíquica em conflito com o id, o supereu e a realidade; Lacan desvela o eu como uma imagem alienada, estruturada no campo do Imaginário, distinta do sujeito dividido do inconsciente; Dolto, por sua vez, mostra que o eu se enraíza numa imagem do corpo construída na relação simbólica com o outro. Em todos os três, a constituição do eu é um processo mediado, não espontâneo, profundamente marcado pela linguagem, pelo desejo e pela alteridade.