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Desafio - Módulo VII

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A remota possibilidade de uma pessoa sequestrando crianças e utilizando magia negra contra elas, choca quem vê a notícia e gera uma necessidade de fazer justiça com as próprias mãos. Se a notícia foi gerada por um canal considerado de confiança pela região, ela já tem credibilidade. O retrato falado dá um rosto ao criminoso e torna isso mais real ainda na mente das pessoas, a ponto de não verificarem a veracidade dos fatos, e principalmente, se tratava-se da mesma pessoa, antes de tomar alguma atitude.

A notícia traz uma reação, seja ela boa ou ruim. Essa sensação nos leva a abraçar aquela causa. Quando a sensação é boa, tendemos a trazer para a nossa realidade e quanto é ruim, alimentamos um sentimento de justiça e esse sentimento cega o ser humano, fazendo com que a relação com o real seja o principal.

O que caracterizou a imagem veiculada como real,  e explica essa tomada dos leitores como real são diversos fatores, interligados à dinâmica simbólico-imaginária... Segundo a teoria da imagem, por se apresentar como fragmento direto da realidade: no caso, um retrato falado criminal (feito pela polícia) circulou nas redes como se fosse um indício autêntico e direto da criminalidade — conferindo-lhe uma aura de verdade imediata. A (falsa) identificação visual deu à imagem uma camada de realidade que mobilizou as ações violentas.

No sentido lacaniano, o real é justamente aquilo que foge à total simbolização. No caso, a imagem causou um impacto imediato, violento e irredutível — a ação coletiva de linchamento — e além disso, revelou algo impossível de ser contido apenas pelo discurso racional. O retrato falado atuou também como símbolo de ameaça (“sequestradora de crianças”), e ao mesmo tempo alimentou a ilusão de poder representá-la visualmente — aspecto imaginário. Esse cruzamento simbólico-imaginário reforçou sua “verdade aparente”.

Esse tipo de imagem é tomada como real não porque corresponde ao real, mas porque encarna uma construção simbólica (representação de ameaça) que, através do imaginário (medo coletivo), gera uma reação no real (o linchamento) — numa relação compreensiva entre psiquê e imagens.

Um retrato falado, mesmo sem contexto, carrega a aparência de autoridade oficial, foi gerado por policiais e representa de forma direta um suspeito.

Assim, muitos assumem tratar-se de uma informação legítima, sobretudo no contexto de pânico social sobre crimes infantis.

A imagem ativou um cenário ameaçador que já existia alimentando o imaginário coletivo trazendo medos profundos como o de sequestros infantis, produzindo uma leitura imediata e emocional — a vítima foi imediatamente desumanizada como ameaça.

A circulação viral criou uma “certificação social”: “se muitos acreditam, então deve ser verdade”. A falta de checagem e a rapidez da propagação permitiram que o símbolo (imagem) fosse aceito como realidade e desenvolvesse um impulso coletivo de justiça imediata: Uma vez que a imagem foi aceita, o desejo de agir (vingança, proteção social) foi ativado. O imaginário coletivo transformou-se em ação direta, violenta — conduzida como “justiça popular”.

Imagem “real” no sentido lacaniano não é neutra: ela estrutura o real através do simbólico e do imaginário.

No caso de Fabiane, a imagem (retrato) simbolizou ameaça, ativou o imaginário de pânico coletivo e foi tomada como prova — migrando direto para o real com consequências trágicas.

Os leitores, imersos nesse contexto simbólico (onde a imagem falava mais que argumentos), reagiram emocionalmente, sem filtro simbólico crítico, por ausência de mediação. O efeito foi uma inversão terrível: o imaginário transformado em real.

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